Após contarmos a história de Benedicto — a criança leiloada em Alenquer — hoje relembramos a trajetória de Sinhá Romana, personagem marcante da história local e uma das primeiras moradoras da região que viria a se tornar o bairro da Luanda (ou Loanda).

Segundo a pesquisa da historiadora Auréa Nina, no Trabalho de Conclusão de Curso “Loanda, sua história, sua luta”, Sinhá Romana foi uma escravizada doméstica que fugiu de Belém junto a outros negros em busca de liberdade e abrigo. Ao chegarem a Alenquer, encontraram uma área ainda inabitada, de mata virgem, onde começaram a limpar o terreno e construir um lar.

A resistência de Sinhá Romana

A história conta que, enquanto o grupo buscou se estabelecer na região mais afastada, Sinhá Romana decidiu erguer sua morada às margens do que hoje é a Rua 10 de Outubro, área mais próxima da Capela de Santo Antônio e, portanto, da zona considerada “branca” na lógica segregacionista da época.

Essa aproximação não foi aceita pelos coronéis que exerciam poder local naquele período. Segundo os relatos coletados por Auréa Nina junto a moradores antigos, os coronéis Ivo Alves e Josino Sena teriam ido pessoalmente ao local para expulsar Sinhá Romana e ordenar sua prisão.

Mas por que ela e não os demais?
A resposta está na própria estrutura social da escravidão: Sinhá Romana estava próxima demais do espaço reservado às elites, e sua presença ali era vista como uma afronta à ordem racial imposta. O episódio revela claramente a forte segregação vivida naquela época.

Violência, expulsão e memória

Relatos dizem que Sinhá Romana foi humilhada, agredida e repetidas vezes perseguida até finalmente ser expulsa da área. O dia de sua expulsão — 10 de outubro — teria dado nome à rua que ali se formou.

Com o tempo, a população negra só pôde construir residência além da Rua 10 de Outubro, o que contribuiu para a consolidação do bairro da Luanda, hoje um dos mais tradicionais de Alenquer e símbolo da resistência e identidade afroalenquerense.

Preservar para não esquecer

A contribuição de Auréa Nina, que gentilmente cedeu seu material para estudo e divulgação, é fundamental para que histórias como a de Sinhá Romana não se percam. Sua pesquisa reúne depoimentos de moradores antigos e descendentes que ainda vivem nas imediações da Rua 10 de Outubro, reforçando a importância da memória oral para compreender nossa formação social.

Nesta Semana da Consciência Negra, relembrar Sinhá Romana é lembrar que Alenquer também foi construída pela força, pela dor e pela resistência de pessoas negras que lutaram por espaço, dignidade e liberdade.